As TVs comunitárias precisam operar em sinal aberto

Criados juntamente com a lei nº 8.977/1995 que regulamentou a TV a cabo, como uma espécie de contrapartida social, os canais televisivos comunitários agonizam a olhos nus, sem políticas públicas para implementar o setor.

Esses canais são públicos não estatais, fundados com associações que representam uma parcela da sociedade interessada na democratização da comunicação e devem promover e propagar a produção audiovisual local, fortalecer a cultura, informar e, ainda, podem entreter.

Algumas incongruências na lei levam à discussão a sobrevida do setor, que mesmo envolto em dificuldades, se mantém vivo, precisando sofrer atualização urgentemente, já que a lei, próxima de completar sua terceira década, ficou defasada faz tempo. Hoje, os canais que atendem a comunidade somente são sintonizados no serviço de TV a cabo, ou seja, se a comunidade quer ser ouvida e ter seus pensamentos e valores propagados, para ter acesso ao canal comunitário terá que pagar pelo serviço.

Diversos governos que passaram tiveram a oportunidade de avançar nessa questão de suma importância, mas, simplesmente, ignoraram. Hoje, parte dos responsáveis pelos canais comunitários de todo o Brasil sentem relativa ojeriza dos governos petistas pela forma como os mandatos de Lula e Dilma ajudaram a sucatear os canais.

Por sua origem e função comunitária, esperava-se que um governo mais ligado ao campo progressista, e que tinha um forte discurso de democratização dos meios de mídia, fosse investir pesado em seu desenvolvimento. Ledo engano, os governos de Lula e Dilma (ambos do PT) simplesmente apostaram em inflar os cofres da grande mídia, sem nenhum pudor, através de verbas publicitárias públicas, deixando os canais comunitários à míngua e sem representante no campo público.

O que o Partido dos Trabalhadores (PT) à época não se atentou é que os seus maiores feitos no campo social jamais seriam pauta de um jornal de grande rede ou mesmo nos regionais das afiliadas. O canal comunitário é o que está perto da comunidade e, muitas vezes, tem como produtor de conteúdo o próprio beneficiário dos programas, o que era forte bandeira do partido.

Quando o PT negou suas origens e se direcionou para a grande mídia, acabou municiando financeiramente toda a máquina de comunicação que criou o antipetismo. Para comprovar tal análise, basta comparar o investimento feito em emissoras como Globo e SBT, por exemplo, com qualquer emissora comunitária.

Jamais o impeachment de Dilma Rousseff teria se tornado rápido consenso sem o apoio irrestrito do grupo Globo, maior beneficiado com as verbas públicas de propagandas institucionais, ou mesmo existiria um Sérgio Moro, juiz, que, entre outras coisas, ajudou de forma irresponsável a quebrar grandes empresas estratégicas para nossa economia, ao misturar política, Justiça e força midiática.

Os canais comunitários têm pautas importantes que precisam ser trabalhadas, mas indiscutivelmente a prioridade é passar a operar em sinal aberto. Em tempos de internet, redes sociais e as famigeradas lives, a ida ao sinal aberto é um caminho estratégico para a sobrevida desse importante veículo de comunicação, que, mesmo com todos os revezes, vem sobrevivendo aos conglomerados de comunicação e seus interesses, e também aos governantes ruins. E isso é o que não falta.

por Cristen Charles

 

*Cristen Charles (@cristencharles) tem 38 anos, é jornalista, comunicador e diretor de TV. É vice-presidente da Associação dos Canais Comunitários do Estado de São Paulo (Acesp) e diretor da Associação Brasileira dos Canais Comunitários (ABCCom), sendo um dos fundadores do canal público nacional Com Br TV. Milita pela democratização da comunicação há 20 anos, atuando em associações, coletivos e movimentos populares.

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