Existem coisas das quais a gente já ouviu falar, mas nem imagina como devem ser. Coisas terríveis! Como dizia a minha avó, coisas do arco da velha, obras do tinhoso, do coisa ruim, do chifrudo, do lúcifer, de satanás. Se eu fosse o Riobaldo, do livro Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa, já lascaria mais umas dezenas de sinônimos para o rei do inferno. São coisas, por exemplo, piores do que bater na mãe, do que, segundo personagem de Machado de Assis, em seu conto Causa secreta, cortar as pernas do ratinho de laboratório, só para se divertir.
Pois é, na ficção como na realidade, acontecem coisas ruins. Sempre aconteceram. Até Cristo, que é Deus, foi traído. Quer coisa pior? Na TV, já vi policiais chutando até à morte um pobre coitado. Quer coisa pior? Já li, na Bíblia, que Cristo foi condenado, para o bandido ser inocentado. Quer coisa pior?
Há coisas ruins a rodo, a torto e a direito. Bandido sair livre não é coisa só da Bíblia. Que é isso, camarada? Aconteceu no passado, está acontecendo agora e, o que é pior, acontecerá no futuro. Há mais coisas nesse mundo do que sonha a nossa vã filosofia. Não é Rui Barbosa que, há muito tempo, já disse que estava ficando com vergonha de ser honesto? Que estava vendo triunfar as nulidades? Pois é, a história se repete. Está parecendo aquele cara que, quando lhe disse que preferia ser honesto na política, me disse, indignado: ‘Você, por acaso, é bobo? O que você ganha com isso? ’ No mínimo, ganho o direito de, com orgulho, contar essa história.
Sem dúvida, coisas terríveis estão acontecendo. Vai chegar o dia – podem esperar, que não vai demorar muito – em que a linguiça comerá o cachorro. Vai acontecer. As coisas estão tão loucas, que até isso poderá acontecer. Se aparecer um ET na Terra, vai sair correndo de volta para o seu planeta. ‘Aqui, não. Peguei o bonde errado.’
É impressionante. Quando a gente pensa que tudo de ruim já aconteceu, que já chegamos ao fundo do poço, arranjam um jeito de criar o subsolo do poço. E vamos mais para o fundo. Tudo se transforma em interesse particular. Tudo se transforma em levar vantagem. Tudo se transforma numa competição em que só eu posso vencer. E ninguém segue as regras. A única regra que existe é ‘quem pode mais chora menos’. Essa competição é uma verdadeira casa da mãe Joana. Perdão, na casa da mãe Joana deve
haver regras mais claras que o vale-tudo que estamos presenciando atualmente. Enquanto isso, morrem pessoas. Enquanto isso, pessoas vão perdendo as esperanças. Enquanto isso, pessoas vão chegando à conclusão de que o esforço não vale a pena. É uma pena! Muito terrível.
BAHIGE FADEL