Miguel (5), negro, é levado ao trabalho com a mãe, doméstica. A mãe tem que descer pra levar o pet da patroa fazer xixi. A triste e maldita estrutura escravista que nos persegue há séculos. Por que dizer que ele é negro? Porque precisamos pensar no que é conhecido (nem tanto) como racismo estrutural ou silencioso. Esse racismo que mata com o olhar, com uma piada, com um deboche, com um desprezo.
Miguel fica aos cuidados da patroa, socialite de Recife, que estava também ocupada com a manicure. Vidas negras importam? Logo logo, alguém vai dizer que esse assunto já deu o que tinha que dar e que o tema ficou cansativo.
Cinco minutos depois, a patroa coloca Miguel no elevador e aperta o nono andar.
POR QUÊ? Pro Miguel dar uma voltinha na cobertura? Sozinho? Tamanho o desprezo e a indiferença com a vida do filho da empregada. Quem em sã consciência humana põe uma criança de 5 anos para ir sozinha na cobertura de um prédio?
Miguel cai no vão livre do prédio.
Mãe volta.
Porteiro diz que ouviu um barulho. Será que alguém caiu?
A mãe encontra Miguel morto.
“Eu não consigo respirar”, diz a frase agora em português, no chão da nossa triste realidade. A mesma que mata os mesmos há muito tempo. Se pudesse, ele diria: “eu só queria minha mãe!” – sim Miguel, nós sabemos!
Negligência? Só?
Patroa paga fiança e é liberada.
Não existe racismo no Brasil? Existe Casa Grande e Senzala. O resto é tragédia. O pet passa bem.
O Brasil, não!
Renato Ruiz Lopes