O deputado estadual Fernando Cury (Cidadania) conseguiu nesta quarta-feira (13) uma liminar na Justiça de Brasília para suspender o processo disciplinar interno que corre contra ele no partido. Ele foi acusado de ferir o código de ética da legenda depois de ter tocado nos seios da deputada Isa Penna (PSOL) no plenário da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), em dezembro do ano passado
Neste domingo (10), o Conselho de Ética do Cidadania recomendou ao diretório nacional a expulsão de Cury do partido e considerou que o episódio de importunação sexual na Alesp foi “desrespeitoso, afrontoso e deve ser combatido” (leia mais sobre o crime de importunação sexual ao final desta reportagem).
A expulsão de Cury seria decidida na reunião do diretório nacional nesta quarta, mas o encontro foi suspenso por causa da decisão judicial.
A juíza Thassia de Moura Guimarães, da 20º Vara Cível de Brasília, entendeu que o processo contra o deputado deve ser primeiro direcionado ao conselho de ética no âmbito estadual do Cidadania em São Paulo. Depois disso é que ele deve ser analisado no âmbito nacional.
Apesar da liminar favorável, Cury continua afastado das tarefas do partido, incluindo a de liderança da sigla na Alesp.

Deputada do PSOL assediada em sessão da Alesp diz que colega estava alcoolizado
O saber do parecer favorável ao afastamento dele no Conselho de Ética do Cidadania no domingo (10), Fernando Cury disse que não tem “dúvidas de estar sendo submetido a um julgamento ilegal, sumário e de exceção, que viola o Código de Ética do próprio partido e a Constituição Federal”.
“Dentro da Assembleia Legislativa de São Paulo, onde respeita-se o direito de defesa e o devido processo legal, irei demonstrar que não violei o decoro parlamentar, bem como jamais assediei nem tive, em nenhum momento, a intenção de constranger a nobre deputada Isa Penna, a quem respeito e sempre respeitei”, afirmou.
Histórico do caso
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_59edd422c0c84a879bd37670ae4f538a/internal_photos/bs/2020/k/7/xONBWxSECSWFzPTNH6Fw/montagem-deputada.jpg)
Deputado denuncia colega por assédio na Alesp – Fernando Cury e Isa Pena — Foto: Reprodução
Fernando Cury foi afastado das funções dele no Cidadania em 18 de dezembro, após a repercussão do caso de importunação sexual nas redes sociais. Na ocasião, o Cidadania declarou em nota que “a acusação refere-se a uma conduta absolutamente incompatível com os princípios defendidos pela legenda”.
O deputado também é alvo de um pedido de cassação no Conselho de Ética da Alesp. Os membros do conselho decidiram que o caso de importunação sexual só será analisado pelo colegiado em fevereiro, após o fim do recesso.
O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Alesp é composto por oito membros, mas apenas uma é mulher, a presidente do colegiado Maria Lucia (PSDB). O deputado Carlos Giannazi (PSOL) afirmou que cederá sua cadeira para a colega de partido Erica Malunguinho, com o objetivo de aumentar a representatividade.
Em dezembro, a deputada Isa Penna e suas advogadas foram à Procuradoria-Geral de Justiça para abrir outra investigação contra Cury – em razão do mandato de deputado, ele tem foro privilegiado.
O procurador-geral Mário Luiz Sarrubbo afirmou que o deputado receberá uma intimação para prestar depoimento, o que estava previsto para acontecer a partir de janeiro. O crime investigado é o de importunação sexual, conhecido popularmente por assédio sexual. Em caso de condenação, a pena vai de um a cinco anos de prisão.
“Eu não aceito e nem as mulheres brasileiras aceitam a desculpa do deputado. O que ele cometeu foi crime ele precisa, no mínimo, começar a reconhecer que cometeu um crime, pra gente começar a debater qual é a retratação cabível à altura do que ele fez. O corpo nosso não é público. Só toca no corpo de uma mulher quem ela quiser”, disse Isa ao Fantástico.

Cury e Penna discursaram em plenário
Na noite após a divulgação dos vídeos que mostram o caso de importunação sexual da Alesp, os dois deputados discursaram sobre o caso no plenário. Isa Penna disse que a situação demonstra a “violência política e institucional contra as mulheres”.
“O caso que a gente vive não é isolado. A gente vê a violência política e institucional contra as mulheres o tempo todo. O que dá direito de alguém encostar numa parte íntima do meu corpo? Meu peito é íntimo. É o meu corpo. Eu estou aqui pedindo pelo direito de ficar de pé e conversar com o presidente da Assembleia sem ser assediada”, afirmou Isa Penna.
No plenário, Cury pediu desculpas por “abraçar” a colega. Ele negou que houve assédio ou importunação sexual.
“Em primeiro lugar, gostaria de frisar a todos, principalmente às mulheres que estão aqui, que não houve, de forma alguma, da minha parte, a tentativa de assédio, importunação sexual ou qualquer outra coisa ou qualquer outro nome semelhante a esse. Eu nunca fiz isso na minha vida toda”, afirmou.
“Mas se a deputada Isa Penna se sentiu ofendida com o abraço que eu lhe dei, eu peço, de início, desculpa por isso. Desculpa se eu a constrangi. Desculpa se eu tentei, como faço com diversas colegas aqui, de abraçar e estar próximo. Se com esse gesto eu a constrangi e ela se sentiu ofendida, peço desculpas.”
Em outro momento do discurso, Cury disse que a chefe de gabinete dele é mulher e que está acostumado a abraçar e beijar suas colegas de trabalho.
“Meu comportamento com a deputada Isa Penna é o comportamento que tenho com cada um dos deputados aqui. Com os colegas deputados, as colegas deputadas, com os assessores e com as assessoras, com a Polícia Militar femininas aqui. De cumprimentar, de abraçar, de beijar, de estar junto. A minha chefe de gabinete é uma mulher”, afirmou.“Eu tenho assessoras mulheres aqui, no escritório em Botucatu. Quantas câmeras tem aqui na Assembleia Legislativa? Estava na frente do presidente. Pelo amor de Deus. Eu não fiz nada disso. Não fiz nada de errado. O que eu fiz foi abraçar.”
Importunação sexual
O Código Penal estabelece, no seu artigo 215-A, como importunação sexual “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”. Ele prevê pena de reclusão de um a cinco anos, em caso de condenação. Em razão da pena máxima estipulada em lei, acusados desse crime podem, em tese, ser presos em flagrante.
Assédio sexual é diferente. Ele requer que o agente – ou seja, o acusado – use “da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”.
Pela lei, portanto, uma situação entre pares (como a ocorrida entre um deputado e uma deputada) não se enquadraria – em tese – em crime de assédio sexual.
O Código Penal prevê uma pena mais baixa para assédio sexual: detenção de 1 a 2 anos. Na prática, isso impede, inclusive, que um acusado seja preso em flagrante somente com base nesse delito.
fonte: G1
Foto: Divulgação/Agência Alesp