O Direito de Família e a mulher brasileira

Chegou o mês de março e uma data muito importante merece ser comemorada por nós mulheres: o Dia Internacional da Mulher.
A origem desse dia se deu nos Estados Unidos, na cidade de Nova York, há exatos 111 anos, em um contexto de Revolução Industrial no qual a desigualdade de gênero no âmbito profissional era notória. O Partido Socialista, no dia 20 de fevereiro de 1909, organizou uma jornada de manifestação pela igualdade de direitos civis e em favor do voto feminino. Na Europa, o movimento feminino também ganhou força e, em agosto de 1910, foi realizada a Segunda Conferência Internacional das Mulheres Socialistas visando a criação de um movimento sindical dedicado às mulheres, cujos direitos trabalhistas eram inferiores aos dos homens. Mas foi a Organização das Nações Unidas (ONU) que, em 1975, oficializou o dia 08 de março como o Dia Internacional da Mulher.
E no Brasil? Como as mulheres foram conquistando os seus direitos? O Código Civil de 1916, que começou a ser elaborado em 1899, considerava a mulher frágil e vulnerável. As leis estavam de acordo com a sociedade da época – conservadora e patriarcal. Quem possuía o poder era o patriarca e, por essa razão, o casamento tornava a mulher relativamente incapaz, sendo necessária a autorização de seu marido para trabalhar. Era obrigatório que a mulher adotasse o sobrenome de seu cônjuge.
A primeira conquista feminina no ordenamento jurídico brasileiro foi a criação do Estatuto da Mulher Casada (Lei 4.121/62), o qual alterou vários artigos do Código Civil de 1916. As principais mudanças previstas no Estatuto foram a devolução da plena capacidade à mulher, dispensando a autorização marital para o trabalho e o compartilhamento do pátrio poder, dando fim à chefia absoluta da sociedade conjugal pelo homem.
Por sua vez, a Lei do Divórcio (Lei 6.515/77) possibilitou o rompimento definitivo do vínculo do casamento. Foi uma conquista muito importante, vide que o Direito de Família ainda era influenciado pelos valores da Igreja. Além disso, substituiu a expressão “desquite” por “separação”, sendo necessária a prévia separação do casal por no mínimo cinco anos para a obtenção do divórcio. Todavia, somente era possível casar novamente apenas uma vez.
Mas a maior mudança no Direito de Família Brasileiro ocorreu com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que igualou homens e mulheres perante a lei, introduzindo a igualdade de gênero como valor constitucional. Isso se deu em razão do ingresso da mulher no mercado de trabalho, o qual contribuiu para o empoderamento feminino. Ademais, na carta magna ainda foram reconhecidas como família a união estável e a família monoparental, formada por apenas um dos pais.
O advento do Código Civil de 2002 refletiu a igualdade de gêneros trazida pela Constituição. Hoje, as mulheres não são mais vistas como submissas pela ótica do Direito de Família. Por essa razão, as suas proteções legais foram reduzidas, principalmente, no âmbito financeiro. A título de exemplo, a pensão para ex-mulher, que, antigamente, era a regra, agora é temporária e virou exceção. Por sua vez, a guarda dos filhos menores é compartilhada, facilitando que a mulher consiga trabalhar e permitindo que o pai participe mais ativamente da criação e educação de seus filhos.
Como se vê, o Direito avançou, e muito, em relação às conquistas femininas. Quando comparamos a nossa situação nos dias de hoje com as nossas avós e bisavós, vemos que somos privilegiadas. Temos leis e uma Constituição Federal que nos dão direito ao trabalho, ao voto, ao divórcio, à integridade física, moral e sexual, além de muitos outros direitos. Mas será que, na prática, a igualdade de gênero é total? As mulheres, finalmente, podem ser consideradas independentes? Essa reflexão precisa levar em consideração o convívio afetivo, familiar, social e profissional das mulheres.
Infelizmente, a sociedade brasileira ainda é bastante machista. No Brasil, a maioria das mulheres possuem a chamada tripla jornada de trabalho, sendo obrigadas a trabalhar fora, cuidar da casa e dos filhos. Desta forma, acabam dependendo financeiramente e emocionalmente de seus maridos. Essa é a nossa triste realidade.
Apesar dos avanços na legislação para proteger as mulheres vulneráveis em determinadas situações, como, por exemplo, a Lei Maria da Penha e a criminalização do feminicídio, o sistema jurídico precisa com urgência aprimorar os seus entendimentos em relação ao tratamento dado à mulher. Isso porque, na maioria dos casos, é a mulher que deixa definitivamente ou temporariamente o mercado de trabalho para cuidar dos filhos menores, que falta o trabalho quando o filho fica doente, sem contar o elevado número de mulheres que perdem seu emprego logo após a volta da licença maternidade. E quando se separam, devido a toda carga que lhes foi imputada durante o matrimônio, se deparam com uma enorme dificuldade de recomeçar suas vidas afetivas e profissionais.
A sociedade já avançou e muito, mas ainda temos um longo caminho a percorrer! Graças aos avanços, já nos vemos em cargos de poder tanto públicos quanto privados, servindo de inspiração para várias jovens mulheres que nos observam e estamos de parabéns!
Debora Ghelman | especialista em Direito Humanizado nas áreas de Família e Sucessões

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