A história de uma jovem esquartejada pelo marido no século 19 que se tornou milagreira.
A tragédia de Ana Rosa chocou Botucatu. Mais de 130 anos depois, o túmulo da moça, uma construção rosa modesta localizada no Cemitério Portal da Cruzes, ainda é preservado pelos moradores da cidade e homenageada com uma festa no mês de Setembro. Hoje é símbolo da luta da mulher contra a violência e o
feminicídio.
Ana Rosa teve uma capela erguida em seu nome, em 1921, no local em que seu corpo foi encontrado
Ana Rosa se casou com apenas 15 anos e foi a segunda mulher de Chicuta, homem de 40 anos, não há registros sobre a primeira. Nos cinco anos em que durou a união, o casal viveu em uma fazenda na região de Avaré, a 77 km de Botucatu.
Cansada de apanhar e ser maltratada pelo marido, conhecido por ser agressivo e ciumento, ela aproveitou uma viagem a trabalho dele para fugir de casa, tendo recebido ajuda de um escravo do marido, que levou Ana Rosa para Botucatu, onde a moça tinha uma tia que era costureira em um cabaré, local
em que também morava.
O plano de Ana Rosa era passar uns dias com a tia até conseguir fugir para o Sul do país e sumir para sempre do marido. Quando voltou de viagem, Chicuta descobriu a fuga, matou o escravo que ajudou Ana Rosa e seguiu para Botucatu em
busca da mulher.
Tentou tirá-la à força do cabaré, mas foi impedido pela tia de Ana Rosa e pela dona do bordel, Fortunata Jesuína de Melo. Furioso, Chicuta contratou dois capangas e bolou um plano, um deles, José Antônio da Silva Costa, o Costinha, se aproximaria de Ana Rosa, conquistaria a confiança da jovem e diria conhecer uma comitiva de tropeiros que poderia levá-la até o Paraná.
O plano deu certo! Na madrugada de 21 de junho de 1885, ela seguiu com o moço para a região do Rio Lavapés, direto para a emboscada que resultaria na sua morte.
Na manhã do dia 22 de junho de 1885, um fazendeiro encontrou o corpo de Ana Rosa, mutilada, sem os seios, orelhas, lábios, dedos e língua.
Graças a uma escrava que viu o crime, foram reconhecidos os assassinos e a
vítima.
Os assassinos foram a julgamento, mas Chicuta foi absolvido, alegando ter cometido o crime em defesa de sua honra. Costinha, por ser de uma família rica da região, também foi absolvido. O único condenado foi o capanga Hermenegildo Vieira do Prado, conhecido como Minigirdo, filho de escravos.
Pouco tempo depois, os envolvidos com o assassinato de Ana Rosa morreram de forma trágica: Minigirdo foi o primeiro, tendo contraído varíola na prisão
e ali morrido. O segundo foi Costinha, que foi esmagado por uma árvore enquanto a cortava. O último foi Chicuta que, ao consertar o carro de boi em que viajava, uma das rodas do veículo passou sobre seu pescoço e o matou degolado.
Devotos de Ana Rosa costumam atribuir ao espírito da moça as mortes de seus algozes.
Não há informações precisas sobre o início do culto em torno de Ana Rosa e seus milagres, a santa popular tem até uma oração própria:
“Oh! Alma piedosa de Ana Rosa, vós que tão bem conheceis os sofrimentos desta vida, intercedei por nós junto a Todos os Santos, a Nossa Senhora Mãe de Deus e a Jesus seu filho. Rogai pela diminuição de nossa provação e pela solução dos nossos problemas [pensar no problema]. Ajudai-nos a ser merecedores da Misericórdia
Divina”.
Por mais de 70 anos, a história de Ana Rosa foi passada de geração em geração, até que, em 1957, a dupla sertaneja Tião Carrero e Pardinho gravou uma música
que conta a tragédia da jovem, intitulada de ANA ROSA. O botucatuense Davi Franque conheceu a história de Ana Rosa por meio da música de Tião Carreiro e Pardinho, se tornou um admirador da moça, tendo feito um curta metragem com recursos próprios para contar a história da jovem assassinada.
Em 1998, Ana recebeu um livro em sua homenagem: Ana Rosa – Sua Vida, Sua História.
Virou tradição em Botucatu, as pessoas irem no cemitério visitar túmulos de seus parentes e também passarem no túmulo de Ana Rosa para rezar, agradecer, fazer
pedidos ou somente uma visita. Ana Rosa se tornou símbolo de coragem, no Dia de Finados, o jazigo da jovem é um dos mais visitados segundo a Secretaria de Turismo de Botucatu, cerca de 500 pessoas de várias partes de São Paulo passam pelo local e deixam flores e cartas.
Mas Ana Rosa não é considerada santa pela Igreja Católica. No Dia de Finados de 2012, um grupo de devotos começou a recolher assinaturas de visitantes do túmulo de Ana Rosa. O objetivo é reunir provas para se fazer um pedido de beatificação à Igreja Católica.
A festa em homenagem a Ana Rosa tem duração de três dias , sexta, sábado e domingo, resgata a cultura caipira com apresentação de moda de violas, apresentação de orquestra, bingos beneficente, chegada da cavalgada e desfile de cavaleiros com a bandeira da Capela de Santa Cruz de Anna Rosa, chegada do clube de motos Insanos, Missa Solene, almoço, barracas de comes e bebes e palestras.
Juliana Gomes Freire