Na próxima Conferência das Partes da Convenção de Minamata sobre Mercúrio (COP4), em março de 2022, 137 países representando mais de 6 bilhões de pessoas votarão em uma proposta para eliminar a iluminação fluorescente que contém mercúrio. Se adotada, a emenda, introduzida pela região africana, evitaria 3,5 gigatoneladas de emissões de CO2, ao mesmo tempo em que eliminaria 232 toneladas de poluição por mercúrio e reduziria o uso global de eletricidade em 3% entre 2025-2050. O governo brasileiro tem a oportunidade de apoiar o fim global da iluminação fluorescente tóxica na próxima reunião.
Para ajudar a divulgar a importância desta transição para o meio ambiente e para a saúde pública, diversas organizações se uniram na execução de um projeto de modernização do sistema de iluminação em hospitais de três países: Brasil, Filipinas e Nigéria. No Brasil, a iniciativa chamada Projeto Iluminação Livre de Mercúrio na Saúde, promovida pela Coalizão pela Iluminação Limpa (CLiC) e coordenada pelo Projeto Hospitais Saudáveis (PHS) em colaboração com o Centro de Análise, Planejamento e Desenvolvimento de Recursos Energéticos (CPLEN) do Instituto de Energia e Ambiente da USP, e a Rede Kigali (que reúne organizações da sociedade civil brasileira pela eficiência energética), vai ocorrer no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu e será anunciada publicamente no dia 9 de março. “Este projeto visa demonstrar como é fácil adaptar unidades de saúde. Ao substituir a iluminação hospitalar atual por LEDs, além de melhorarmos as condições de trabalho para as equipes, diminui-se os riscos de saúde pela exposição ao mercúrio” – Nyamolo Abagi, líder de indústria na CLiC.
Todas as lâmpadas fluorescentes contêm mercúrio. O mercúrio é altamente tóxico, razão pela qual a Organização Mundial de Saúde o enumera entre os 10 principais produtos químicos ou grupos de produtos químicos de maior preocupação de saúde pública. Quando estas lâmpadas de vidro se partem, os vapores tóxicos são liberados para o ar. Não existe um nível “seguro” de exposição ao mercúrio; a absorção de vapores de mercúrio por bebês e crianças aumenta o risco de deficiências de desenvolvimento para toda a vida. Para mulheres grávidas expostas ao mercúrio há riscos para o feto.
Ciente disso, o Hospital das Clínicas de Botucatu vai anunciar publicamente o seu compromisso em reequipar a iluminação de parte das suas instalações, substituindo as ineficientes lâmpadas fluorescentes contendo mercúrio por lâmpadas LED eficientes. O hospital, que já tem uma longa trajetória em ações de sustentabilidade, desde 2013 é membro da Rede Global Hospitais Verdes e Saudáveis liderada pela organização internacional Saúde Sem Dano, da qual o PHS é o parceiro estratégico no Brasil.
Sua primeira ação enquanto membro foi o banimento de equipamentos médicos com mercúrio. Participando de ações climáticas, o hospital conseguiu reduzir em 33,4% suas emissões de gases de efeito estufa em 2020, além de ter aderido à campanha Race to Zero, visando zerar suas emissões até 2050. As ações do hospital lhe renderam em 2021 a premiação em Liderança Climática pela Saúde Sem Dano. O Hospital das Clínicas de Botucatu também tem ações em iluminação, em 2017 foi organizada a Campanha Ilumina HC, onde a comunidade (pacientes, funcionários, alunos) se organizou para doar e arrecadar lâmpadas LED, procurando substituir aos poucos as lâmpadas fluorescentes. O Projeto Iluminação Livre de Mercúrio na Saúde vem para ajudar o HC a continuar seu caminho em ações de sustentabilidade e ação climática.
A Professora Dra. Karina Pavão da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB – UNESP) dirige o núcleo “Hospitais Sustentáveis do HCFMB de Botucatu”. Ela ressalta que “a poluição por mercúrio é tema conhecido para a saúde pública e deve-se eliminar o seu uso sempre que possível”, ainda observa que “o Projeto Iluminação Livre de Mercúrio na Saúde condensa diversas demandas de sustentabilidade dentro de um serviço de saúde pois elimina um produto com mercúrio, diminui a geração de resíduos devido a maior vida útil das lâmpadas LED, diminui o consumo de energia elétrica e, consequentemente, diminui as emissões de gases de efeito estufa”.
Ao todo, o hospital vai trocar até 3 mil lâmpadas, o que corresponderá a uma economia de até 43% em relação ao sistema anterior. A intervenção será feita numa área ambulatorial de cerca de 3.000 m², onde são realizadas diariamente 580 consultas nas áreas de Pediatria e Saúde Mental Infantil, Ginecologia e Obstetrícia e Ortopedia. O objetivo é encorajar os consumidores, empresas e instituições a seguir o seu exemplo. “Ao substituir as fluorescentes por LEDs, além da sustentabilidade ambiental e proteção à saúde humana, poderemos diminuir nossa conta de energia do hospital, reduzindo grandemente os custos operacionais. Estas economias para um hospital público são fundamentais, ainda mais frente às necessidades e demandas extras que a pandemia do COVID-19 nos trouxe. Além disso, com este projeto será possível adquirir iluminação de maior qualidade, proporcionando melhor ambiente de trabalho para os nossos trabalhadores e prestadores de cuidados dentro do HCFMB” Prof. Dra. Karina Pavão.
No passado, as lâmpadas fluorescentes eram promovidas como uma melhor alternativa às lâmpadas incandescentes e halógenas, e os riscos associados ao mercúrio em fluorescentes eram tolerados como uma compensação necessária. Hoje em dia, graças aos grandes avanços na tecnologia de diodos emissores de luz (LED), as lâmpadas LED sem mercúrio podem substituir de forma rentável as fluorescentes em praticamente todas as aplicações. Além disso, as LED duram mais do que as lâmpadas fluorescentes, devido ao seu menor consumo de energia e por serem livres de mercúrio são equipamentos mais adequados do ponto de vista ambiental. “As lâmpadas fluorescentes foram a principal opção tecnológica de iluminação para as últimas décadas principalmente devido a sua maior eficiência energética quando comparadas a tecnologia anterior, as lâmpadas incandescentes. Hoje, o advento do LED torna as lâmpadas fluorescentes ultrapassadas em termos de eficiência energética e em termos de poluição ambiental, visto que o LED não contém mercúrio e tem maior vida útil”, diz Erick Pelegia, especialista em eficiência energética do Projeto Hospitais Saudáveis.
A verdade é que a remoção do mercúrio é tão fácil como a troca de uma lâmpada de iluminação.. Os LEDs atingem imediatamente a luminosidade total quando ligados, em vez de atrasarem e cintilarem durante minutos inteiros. Hoje em dia, estão disponíveis lâmpadas de LED para substituir todos os tipos de lâmpadas fluorescentes – diferentes tamanhos, comprimentos, tipos de reatores, temperaturas de cor, e níveis de fluxo luminosos. Nesta COP4 da Convenção de Minamata, o governo brasileiro tem a oportunidade de somar forças em direção ao phase out de lâmpadas fluorescentes. Isto é importante para os consumidores do país, já que diminui a poluição por mercúrio devido ao descarte inadequado das lâmpadas, possibilita redução no consumo de energia elétrica e maior qualidade de iluminação para os consumidores.
CONTEXTO HISTÓRICO: A Convenção de Minamata sobre o Mercúrio é um tratado global para proteger a saúde humana e o meio ambiente dos efeitos adversos do mercúrio. O texto da Convenção, conta hoje com cerca de 140 países ratificantes, incluindo o Brasil.
Alguns destaques da Convenção de Minamata incluem o banimento de novas minas de mercúrio e o descomissionamento das existentes, a redução e a descontinuação do uso de mercúrio em diversos produtos e processos e medidas de controle referentes a emissões desse elemento no ar, em corpos d’água ou na terra. A convenção também endereça questões como a armazenagem provisória de mercúrio e sua disposição final, locais contaminados e questões de saúde relacionadas.
No entanto, o texto atual da Convenção de Minamata não inclui em grande parte as lâmpadas fluorescentes nos itens a entrarem num regime de descontinuação (phase-out). Em 2021, os países africanos participantes da Convenção de Minamata propuseram uma emenda mais abrangente sobre as lâmpadas fluorescentes para incluí-las na lista de produtos a serem descontinuados (African Lighting Amendment). Esta emenda será votada durante a COP4, que acontece de 21 a 25 de março em Bali, Indonésia.
A Convenção tem sido bem-sucedida na eliminação progressiva e da redução do uso de mercúrio em vários produtos e processos relacionados com a medicina, incluindo amálgamas dentárias e termômetros. A transição da iluminação em unidades de saúde para os LEDs apresenta também uma oportunidade para ação climática.
Centenas de organizações ao redor do mundo assinaram a Carta Aberta aos chefes da delegação da COP4, que faz parte da campanha Clean Light Coalition (CLiC), coordenada pela CLASP, para eliminar as isenções para mercúrio em iluminação fluorescente. No Brasil, entre os assinantes do documento, temos a Associação Brasileira para o Desenvolvimento do Edifício Hospitalar (ABDEH), a Federação Brasileira de Administradores Hospitalares (FBAH), o Projeto Hospitais Saudáveis e um grupo de hospitais privados, públicos e organizações do setor hospitalar.
SOBRE A CLEAN LIGHTING COALITION (CLiC): campanha global para alavancar o conhecimento especializado e as partes interessadas em iluminação limpa para fazer a transição dos mercados globais para uma iluminação LED segura com economia de energia por meio da remoção de exceções para lâmpadas fluorescentes na Convenção de Minamata sobre Mercúrio. Esta campanha é coordenada pela CLASP e apoiada pelo Climate Imperative e Sequoia Climate Fund.
SOBRE O PROJETO HOSPITAIS SAUDÁVEIS (PHS) – Associação sem fins econômicos dedicada a transformar o setor saúde em um exemplo para toda a sociedade em aspectos de proteção ao meio ambiente e à saúde do trabalhador, do paciente e da população em geral. O PHS desenvolve e apoia uma rede de cooperação em prol da saúde pública e ambiental, partindo do comprometimento das instituições de saúde e dos profissionais de todas as categorias que atuam no sistema de saúde brasileiro.
SOBRE O HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA FACULDADE DE MEDICINA DE BOTUCATU (HCFMB):
O HCFMB é vinculado à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo para fins administrativos e associa-se à Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual “Júlio de Mesquita Filho” – Unesp para fins de ensino, pesquisa e extensão. O HCFMB é a maior instituição pública vinculada ao Sistema Único de Saúde (SUS) na região, atendendo 68 municípios e cerca de 2 milhões de pessoas. Desde 2013, o HCFMB faz parte da Rede Global Hospitais Verdes e Saudáveis por meio do Núcleo de Hospitais Sustentáveis (NHS), um serviço vinculado à Superintendência do Hospital e à Faculdade de Medicina, formado por uma comissão interdisciplinar coordenada pela Prof.ª Dr.ª Karina Pavão, docente do Departamento de Saúde Pública da FMB.
ORGANIZAÇÕES PARCEIRAS DA INICIATIVA
CLASP: ONG internacional que desenvolve estudos técnicos e de políticas que analisam e comparam a realidade brasileira com a de outros países, especialmente em temas relacionados à melhoria do desempenho energético e ambiental dos aparelhos e equipamentos elétricos utilizados no cotidiano. A CLASP atua no Brasil desde 2018, apoiando o Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) e o Ministério de Minas e Energia (MME) no desenvolvimento e na implementação de políticas de eficiência energética. Especificamente, a CLASP forneceu pesquisas sobre o mercado brasileiro e as melhores práticas internacionais, bem como análises de impactos para apoiar as revisões concluídas e pendentes da Etiqueta Nacional de Conservação de Energia (ENCE), do Selo Procel e dos MEPS (Minimum Energy Performance Standards) para condicionadores de ar e refrigeradores. Além disso, a CLASP participa da Rede Kigali, que defende políticas e programas que reduzam o impacto ambiental dos eletrodomésticos no Brasil.
CPLEN: Centro de Análise, Planejamento e Desenvolvimento de Recursos Energéticos sediado no Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da Universidade de São Paulo (USP). O CPLEN realiza pesquisas de planejamento energético, desenvolvimento e aplicação de tecnologias de fontes renováveis e de eficiência energética, redes de distribuição inteligentes, inserção de fontes intermitentes na matriz de geração, usos finais e demanda de energia, dentre outros. O CPLEN realizou, através de chamada pública do Programa de Eficiência Energética (PEE) da ANEEL, com o patrocínio da ENEL Distribuição São Paulo, a substituição de 10 mil lâmpadas fluorescentes por LED no Hospital Universitário da USP, projeto semelhante ao que se pretende com o Projeto Iluminação Livre de Mercúrio na Saúde.
REDE KIGALI: A Rede Kigali tem como propósito promover a eficiência energética como um instrumento para atingir múltiplos benefícios para a sociedade brasileira e para o consumidor. A eficiência energética, e as políticas e os mecanismos que a promovem, são tratados pela Rede Kigali não como um fim em si mesma, mas como um meio com diversos objetivos, entre eles oferecer para os consumidores aparelhos mais baratos e mais econômicos no consumo de eletricidade e dinamizar os setores econômicos envolvidos com a realização de investimentos em inovações tecnológicas, geração de emprego, aumento da produtividade e competitividade. Mais informações sobre o trabalho da Rede podem ser obtidas no site: kigali.org.br. A Rede é composta pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS), International Energy Initiative – IEI Brasil, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), consultoria Mitsidi Projetos, Projeto Hospitais Saudáveis (PHS), rede de jovens Engajamundo e CLASP.
com assessoria