Porque um céu tão distante?

Eu estava com meus filhos na sala de espera do dentista. Uma família formada por uma mãe, uma pré-adolescente e uma criança de aproximadamente oito anos, também aguardavam sentados em nossa frente conversando entre eles. A mãe olhou para filha e disse que naquela semana eles teriam mais algumas atividades religiosas, na igreja. A menina respondeu com uma fala decepcionada, dizendo sobre a falta de tempo para viver. A mãe com poder inquisidor disse as seguintes palavras que não vou esquecer:

‘Minha filha, nosso lugar não é aqui, estamos pensando no céu’.

Aquilo mexeu comigo por alguns motivos. O que temos feito e ensinado as futuras gerações? Qual vida damos a eles? O primeiro deles é porque minha vontade era falar com aquela mãe sobre a vida, sobre o viver, e sobre o céu que já pode ser vivido hoje.

Segundo lugar, é que me entristeceu profundamente, esse é o pensamento da maioria cristã. Uma fé que leva pro céu. Uma fé que pouco se conecta nesse mundo aqui.

Terceiro, a meritocracia cristã, a perspectiva de merecimento e conquista pela dedicação a ‘obra de Deus’ (a saber instituição religiosa e pré-requisitos no caso).

Creio que os três pontos citados acima estão conectados entre si. Tenho entendido a necessidade de falar da Vida para quem pensa viver. É impressionante a alienação que vive o povo que se converte ao cristianismo (creio que acontece em outras religiões também, mas falo por mim como cristão). Muitas pessoas querem e precisam viver.

Sinto-me motivado em ajuda-las e ser ajudado nesse processo de libertação.

A perspectiva fictícia e metafisica do céu pós morte, prejudica o processo saudável de conversão a Deus e ao próximo. Essa conversão real acontece aqui, enquanto vivemos temos esse sagrado privilegio de se conectar com Deus servindo uns aos outros. Mas os cristãos a muito tempo escolheram as fábulas, as mazelas belicosas da religião. Isso não de hoje nem de agora. É fruto de fatos do passado que não foram bem avaliados e tornaram-se cancerígenos nas teias mais profundas dos templos, de cada canto, cada letra e cada coração da I

Mas ainda assim o desejo idiolátrico quase que gnóstico (tão combatido por Paulo no início dos anos pós Cristo), ecoam do fundo da alma dos cristãos contemporâneos.

Buscam a ‘gnose’, o meio, a chave pela qual vão se conectar com o Sagrado e desfrutar dos privilégios de quem descobriu o grande segredo.

Precisamos urgentemente reinterpretar a vida e nossa aplicação do que Jesus ensinou. Dietrich Bonhoeffer disse certa vez:

‘Devemos reaprender a compreender o significado da solidariedade humana: Deus quer seres humanos, não fantasmas que evitam o mundo. Ele fez da terra nossa mãe. Se você tem anseio por Deus, abrace o mundo; quer encontrar a eternidade, sirva no momento presente.’

Orei por aquela menina, espero poder um dia conversar com ela. Por enquanto vou falando com quem posso e deseja.

Renato Ruiz Lopes

Sobre Régis Vallée

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