Coleta de lixo inadequado em Botucatu compromete a Cuesta

A situação crítica da coleta de lixo na zona rural de Botucatu não apenas evidencia falhas administrativas, mas também configura possíveis infrações legais, tanto em âmbito ambiental quanto contratual.

Os moradores da zona rural de Botucatu estão enfrentando sérios problemas com a coleta de lixo, especialmente em regiões próximas a áreas de grande circulação turística. Um dos pontos mais críticos está localizado na Rodovia João Bruder Greguer entre Botucatu e Pardinho, rota bastante utilizada por visitantes que exploram a Cuesta — um dos principais cartões-postais da cidade.

A situação, que se agravou nos últimos três dias, desde o dia 05/05, é reflexo direto de uma decisão da Prefeitura de Botucatu: a retirada do único Ponto de Entrega Voluntária (PEV) da região, que por anos, serviu como local de descarte de resíduos sólidos para os moradores rurais. A justificativa para a remoção foi o acúmulo excessivo de lixo. No entanto, ao invés de ampliar a frequência da coleta para atender à demanda crescente, a prefeitura optou por simplesmente eliminar o ponto, realizar uma limpeza parcial e instalar uma placa proibindo o descarte no local.

Sem alternativa oferecida pela administração municipal, os moradores voltaram a depositar lixo no mesmo lugar já no dia seguinte à retirada do PEV. Na placa fixada no local, a prefeitura orienta que os moradores rurais levem seus resíduos até a área urbana de Botucatu — uma solução inviável para muitos que vivem longe da cidade e não possuem transporte adequado.

Além do impacto direto sobre a população, a falta de uma solução adequada traz graves consequências ambientais. O acúmulo de lixo, a céu aberto, contribui para a proliferação de vetores de doenças, contaminação do solo e de lençóis freáticos, além da poluição visual em uma das regiões mais visitadas do município. A ausência de gestão adequada desses resíduos contraria princípios fundamentais da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei Federal nº 12.305/2010), que estabelece como responsabilidade do poder público assegurar a coleta seletiva e a destinação ambientalmente adequada dos resíduos, inclusive nas áreas rurais.

A omissão também pode configurar infração ambiental de acordo com a Lei de Crimes Ambientais (Lei Federal nº 9.605/1998), que prevê punições para quem causar poluição que possa resultar em danos à saúde humana ou ao meio ambiente. Ao não oferecer alternativa de descarte, a Prefeitura de Botucatu pode ser responsabilizada por permitir, ainda que indiretamente, o descarte irregular e os danos daí decorrentes.

Leis e Normas que Regem a Coleta de Lixo em Botucatu

1. Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei Federal nº 12.305/2010): Esta lei estabelece que é dever do poder público assegurar a gestão integrada e o gerenciamento adequado dos resíduos sólidos, incluindo a coleta, transporte e destinação final ambientalmente adequada, tanto em áreas urbanas quanto rurais.

2. Lei Municipal nº 3.286/1993: Dispõe sobre o serviço de limpeza pública em Botucatu, definindo como finalidade manter limpa a área urbana do município, mediante coleta, transporte e destinação final do lixo. Embora a lei mencione especificamente a área urbana, a responsabilidade do município pode ser interpretada de forma mais ampla, considerando a necessidade de atender também as áreas rurais.

3. Código Municipal do Meio Ambiente de Botucatu: Este código estabelece diretrizes para a proteção ambiental no município, incluindo a necessidade de implantar sistemas adequados de coleta e tratamento de resíduos, visando preservar a qualidade dos recursos naturais e a saúde pública.

Contribuições dos Proprietários Rurais para a Coleta de Lixo

Os proprietários de áreas rurais em Botucatu contribuem para a manutenção dos serviços públicos municipais, incluindo a coleta de lixo, por meio de impostos como o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto Territorial Rural (ITR). Embora o ITR seja um tributo federal, parte de sua arrecadação é repassada ao município, que deve utilizá-la na prestação de serviços públicos, inclusive na zona rural.

Em 2025, o valor do ITR varia conforme o tamanho e a utilização da propriedade, sendo calculado com base em alíquotas que podem chegar até 20% do valor da terra nua tributável. Já o IPTU é aplicado a imóveis urbanos e também contribui para o custeio dos serviços públicos municipais.

Apesar dessas contribuições, a ausência de coleta regular de lixo na zona rural indica uma possível má gestão dos recursos arrecadados, resultando em serviços públicos inadequados para os moradores dessas áreas.

Impactos Ambientais e Sociais

A ausência de coleta regular de lixo na zona rural de Botucatu tem gerado diversos impactos negativos:

Proliferação de vetores de doenças: O acúmulo de lixo atrai animais e insetos que podem transmitir doenças à população.

Contaminação do solo e recursos hídricos: Resíduos descartados inadequadamente podem infiltrar no solo e atingir lençóis freáticos, comprometendo a qualidade da água.

Degradação da paisagem: O lixo acumulado prejudica a estética da região, afetando o turismo e a qualidade de vida dos moradores.

Desigualdade social: A falta de serviços adequados na zona rural evidencia disparidades no atendimento entre áreas urbanas e rurais.

Possíveis Irregularidades Contratuais na Prestação do Serviço de Coleta

A empresa responsável pela coleta de lixo em Botucatu é a Corpus Saneamento e Obras Ltda., conforme informações disponíveis no site da prefeitura. O contrato firmado prevê a coleta manual e mecanizada, transporte de resíduos sólidos domiciliares e coleta seletiva de materiais recicláveis porta a porta e em Pontos de Entrega Voluntária (PEVs).

A retirada dos PEVs na zona rural, sem a devida substituição ou alternativa para os moradores, pode configurar descumprimento contratual, uma vez que compromete a eficácia do serviço de coleta seletiva previsto no contrato. Além disso, a falta de coleta adequada pode resultar em acúmulo de resíduos, impactando negativamente o meio ambiente e a saúde pública, o que contraria as obrigações legais e contratuais assumidas pela empresa e pela prefeitura.

A crise na coleta de lixo na zona rural de Botucatu não apenas evidencia falhas administrativas, mas também levanta questões legais e contratuais significativas.

A equipe de jornalismo da REDE ALPHA procurou o prefeito Fábio Leite, a Secretária de Comunicação Cínthia Al Lage, a Secretária do Meio Ambiente Bianca Picado e o Secretário de Zeladoria Márcio dos Santos (Dadá) para entender quais providências estão sendo estudadas para resolver o problema. Nenhum deles respondeu até o fechamento desta reportagem.

Enquanto isso, os moradores seguem desassistidos, convivendo com o acúmulo de lixo, o risco ambiental crescente e a sensação de abandono por parte do poder público. A cobrança por uma solução urgente se torna cada vez mais necessária, diante da negligência que compromete a saúde, o bem-estar e a imagem ambiental de Botucatu.

A retirada dos PEVs e a ausência de alternativas para a coleta de lixo na zona rural de Botucatu não apenas desrespeitam os direitos dos moradores, mas também configuram possíveis infrações legais e contratuais. É imperativo que a prefeitura e a empresa responsável tomem medidas imediatas para restabelecer e adequar o serviço de coleta, garantindo a saúde pública, a preservação ambiental e o cumprimento das obrigações legais e contratuais.

foto: Telma Bruder

 

Sobre Fernando Bruder

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