Coluna Bahige Fadel

Intolerância

Será que podemos chamar a época em que vivemos de era da intolerância? Ou seria um exagero? As atitudes públicas que presenciamos nos dias atuais seriam manifestações de intolerância? Ou são manifestações sensatas, equilibradas, racionais, baseadas em argumentos sólidos? As pessoas, hoje, estão raciocinando mais com o cérebro ou com o fígado?

Vamos ver. Para não ficar apenas numa opinião, fui buscar o significado de intolerância. Aliás, opinião, no mundo de hoje, é o que não falta. E as pessoas alardeiam suas opiniões como se fossem verdades absolutas, dogmas até. Aprendi que opinião é bom tê-la, mas que ela tem mais importância para o seu dono do que para a verdade. A verdade é o fato. Já a opinião é um ponto de vista, nada mais. Tenho visto programas que se divulgam como informativos, mas que nada mais são do que programas de opinião. É um perigo para a verdade, quando acreditamos que a opinião é um fato. Mas vamos ao significado da intolerância: ‘Intolerância é a característica que corresponde a falta de compreensão ou aceitação em relação a algo. Uma pessoa que age com intolerância é chamada de intolerante e, por norma, apresenta um comportamento de repulsa, repugnância e ódio por determinada coisa que lhe seja diferente’.

Tá. Acho que ficou claro. O intolerante não aceita aquilo que é diferente do eu ele pensa. Assim, não adianta dialogar com um intolerante. Ele, por princípio, não aceitará nada que seja diferente do que ele quer ou pensa. Será contra. Não adianta você provar por a + b que ele está errado. O que vale é o que acha que deve valer. O intolerante, por mais inteligente que seja, é um mal. Aliás, o intolerante inteligente é mais perigoso do que o intolerante limitado, pois o inteligente é mais capaz de influenciar outras pessoas.

Pelo amor de Deus! Não vão pensar que sou contra aquele que não tolera a corrupção, a desonestidade, a mentira. Estou falando daquele que não tolera absolutamente nada que seja diferente do que ele quer ou pensa. Em política existe muito disso. O intolerante não tolera um político. Então, o que ele faz? É contra. E para justificar a sua posição contrária, ou inventa fatos sobre o tal político, ou distorce fatos sobre o tal político, ou dá a fatos negativos sobre o tal político uma dimensão muito superior à realidade. Ele, o intolerante, é incapaz de ver algum ponto positivo naquilo ou naquele que ele não tolera.

Sabe de uma coisa? O intolerante nunca acha que é intolerante. Ele esbraveja. Grande parte dos intolerantes é raivosa. Como não aceita nada diferente, tende a achar que os diferentes estão errados e/ou são seus inimigos. O intolerante é perigoso, pois tende a perder a noção de certo e errado. Tende a perder a noção de limites. Normalmente, os intolerantes perdem o bom senso. Não precisamos deles. Eles não acrescentam nada de positivo. Os intolerantes mataram Cristo e cristos.

BAHIGE FADEL

Coisas estranhas

Coisas estranhas a gente vê no mundo de hoje. Tudo ao contrário das expectativas. A gente espera por uma coisa, mas o que acontece são coisas totalmente diferentes. Não é questão de ruim ou bom. É só diferente. Lembro que no início da pandemia, o número de mortes era bem menor do que o que estamos vendo hoje, mas o governador pediu para fechar tudo. Era necessário? Não sei. Não sou especialista nisso. Só sei que a economia foi pro brejo, e o número de mortos começou a aumentar. Prendiam pessoas que iam às ruas para passear. Batiam nessas pessoas. E o número de mortes aumentava. Teria sido pior se não fechassem tudo? Não sei. Sei que, embora houvesse o fechamento, as coisas só pioraram. Agora, o governador já não pede para fechar tudo. Até as escolas abrirão nesse segundo semestre. Desde março do ano passado, quando o número de mortos era menor que o de hoje, as escolas estão fechadas, com aulas remotas, mas agora abrirão. É bem verdade que há muitos vacinados, mas as mortes continuam.

Pra falar de coisas mais recentes, que tal pessoas que começaram a torcer para que o Brasil perdesse para a Argentina, na Copa América? Dá para explicar? Dá. Claro que dá. Politizaram também a Copa América, assim como politizaram a pandemia. Como acharam que o Tite é lulista, aqueles que são contra o Lula – alguns – começaram a torcer contra o Brasil. Estranho, né? O Brasil perde para o seu maior rival, e algumas pessoas ficam felizes. Que felicidade é essa?

Mas isso não é novo no futebol brasileiro. Lembram o que aconteceu em 1970? Os mais velhos lembram. Naquele tempo, como estávamos no regime militar, a esquerda começou a torcer contra o Brasil, na Copa do Mundo. Só para não dar motivo de propaganda para o governo militar. Só que naquela época a seleção brasileira era tão boa que podiam botar o mundo inteiro torcendo contra ela, que ninguém a venceria. Nem a esquerda nem a direita.

Coisa estranha. As pessoas perdem uma grande oportunidade de sentir prazer só por causa da política. Enquanto uns fanáticos ficam, aqui em baixo, se digladiando, lá em cima, os políticos ficam se locupletando. Não vale a pena. Todo fanatismo é perigoso e cego. Essas pessoas misturam alho com bugalho e se lascam, perdem o prazer de muitas coisas na vida. Aliás, só para a gente continuar a conversa, eta frase esquisita essa de ‘confundir alho com bugalho’, não é? Muita gente a usa sem saber do que se trata. Parece essa turma que fica dando pitaco (Opinião dada sem ter sido solicitada, às vezes, oriunda de pessoa sem conhecimento de causa e sem motivo para interferir) sobre a COVID-19. No caso do bugalho é menos grave, pois não faz mal a ninguém. Só pra matar a curiosidade, o bugalho tem o mesmo formato do alho:

Vamos ser claros: as pessoas que confundem alho com bugalho não estão com nada. Não é preciso enxergar muito para ver a diferença.

BAHIGE FADEL

Essa língua portuguesa 2

No final do semestre letivo, numa dessas aulas remotas, estava eu comentando sobre a vida de um autor da literatura brasileira e a influência de certos fatos em sua obra literária. Disse aos alunos que o escritor era alcoólico. Imediatamente me veio a lembrança de certa ocasião em que comentava sobre alcoolismo com pessoa conhecida que trabalha na área da saúde – essa pessoa trabalhava nesse setor Assim que disse a palavra ‘alcoólico’, ela me repreendeu: ‘Não é certo falar alcoólico; o certo é falar alcoolista. ’ Tentei argumentar sobre a etimologia da palavra, mas não adiantou: Quer saber mais do que eu, que trabalho nessa área? – foi o argumento final de minha interlocutora. Eu, que não quero saber mais do que ninguém, encerrei a discussão e passei a falar ‘alcoolista’, pois se uma especialista no ramo garante que é alcoolista que se fala, quem sou eu, simples mortal, para contestar?

E o leitor deve estar perguntando: Então, cara pálida, qual é a forma correta de se falar? Para lhe ser franco, para desespero dos linguistas e gramáticos mais radicais, aprendi que a forma que se deve usar é aquela que os outros entendem melhor, mesmo que a gramática diga que não é a forma correta. De que adianta eu falar respeitando todos os padrões gramaticais, se a pessoa com quem converso não está entendendo bulhufas?

Dessa conversa toda, o que fica mais convincente é que não se deve dizer ‘alcoólatra’. Não me parece a forma adequada de nos referirmos à pessoa que tem compulsão em consumir bebida alcoólica. É que ‘latra’ vem do grego e significa adoração. O viciado em bebida alcoólica é um dependente da bebida, não um adorador dela. Já alcoolista ou alcoólico… Vejamos o que dizem os dicionários.

Alcoólico: que ou quem é viciado em bebidas alcoólicas

 

Alcoolista: Característica da pessoa que sofre pelo uso compulsivo de álcool; que sofre de alcoolismo

Alguém está vendo alguma diferença marcante, que eu não consigo perceber? Por outro lado, se você for procurar o significado de ‘alcoólatra’, vai encontrar a mesma coisa. Quer dizer, o uso da palavra ‘alcoólatra’, pelo menos no Brasil, não é com o significado de ‘adorador da bebida’. Alguns linguistas chegam a dizer que alcoólico é um eufemismo de alcoólatra. Alcoólatra teria uma carga semântica mais negativa do que alcoólico. Deve ser por isso que as associações que existem são de Alcoólicos Anônimos. Não conheço nenhuma que seja de Alcoolistas Anônimos.

Algumas pessoas devem estar estranhando que há algum tempo não escrevo sobre política. Explico: é que atualmente há tanta politicagem no meio, que não vale a pena entrar nesse lodo. E aí existe uma diferença gritante. Política não tem nada a ver com politicagem.

política

– arte ou ciência de governar

– arte ou ciência da organização, direção e administração de nações ou Estados; ciência política

– orientação ou método político

– arte de guiar ou influenciar o modo de governo pela organização de um partido, influência da opinião pública, aliciação de eleitores etc.

politicagem

– política de interesses pessoais, de troca de favores, ou de realizações insignificantes

BAHIGE FADEL

Essa língua portuguesa

Vamos começar por partes. O latim é uma língua morta. Assim, ela não sofre transformações. Se a gente for aprender latim hoje, serão as mesmas utilizadas para ensinar latim para o padre Antônio Vieira. Até aí, nenhuma novidade. Também não é novidade que o mesmo não ocorre com a língua portuguesa. É uma língua viva e, por isso, sujeita a modificações. Essas modificações ocorrem de maneiras diferentes. Existe a maneira oficial, que depende de uma legislação que envolve, obrigatoriamente, o Brasil e Portugal. Sem a aprovação desses dois países, não há mudança oficial. Foi o que ocorreu há alguns anos com as regras do uso do hífen e com as regras da acentuação gráfica. Por causa dessas regras, devemos escrever ‘autoaprendizagem’ e não ‘auto-aprendizagem’, como se escrevia no século passado. Pelas mesmas regras, devemos escrever ‘voo’ e não ‘vôo’, como era antigamente. E para todos aceitarem essas pequenas regras foi um parto. Em Portugal, principalmente, até hoje existem resistências.

Se estou dizendo que a língua portuguesa é um ser vivo, devo aceitar que, de tempos em tempos, sofra mudanças. Essas mudanças, na realidade, são adaptações à nova realidade social, que depois passam a ser aceitas pelas gramáticas. Ninguém, por exemplo, acha errado, hoje, dizer ‘não pise na grama’. A não ser que seja um conservador radical. No entanto, a gente sabe que a gramática esclarece que o verbo pisar é transitivo direto. Assim, o correto gramaticalmente é dizer ‘não pise a grama’. Mas nem o papa fala assim!

Todas essas reflexões foram motivadas por um radialista que, ao divulgar uma notícia, disse que ‘as pilotas’ fizeram tal coisa. Pegou mal no meu ouvido. Fui pesquisar se existe essa forma feminina. É que eu aprendi que ‘piloto’ é comum de dois gêneros, como dentista, por exemplo: o piloto, a piloto; o dentista, a dentista. Mas foi uma surpresa. Pesquisei numas cinco fontes. Só que ninguém se entende. Há aqueles que dizem que ‘piloto’ tem feminino e outros que garantem que a palavra é comum de dois gêneros. Mas isso não muda a cotação do dólar nem mata o coronavírus. E aí surge outra questão: coronavírus, corona vírus ou vírus corona? Se for para usar as regras da língua portuguesa, deveríamos dizer ‘vírus corona’, como dizemos ‘vírus ebola’ ou ‘menino prodígio’. Só que aqui se adotou a palavra importada, com o qualificativo antes: ‘fat boy’, ‘strong man’. E é por isso que devemos dizer ‘a’ COVID-19, no feminino: corona vírus disease. É ‘a’ doença do corona vírus.

O duro de aceitar mesmo é o que já estão ensinando em algumas escolas: abolir o masculino e o feminino e passar a usar apenas o neutro. Vai ser esquisito. Já pensaram alguém falando ‘todes es alunes bonites de classe…’? Parece outra língua. Ou lhes parece algo natural?

BAHIGE FADEL

Pós-pandemia

O governo do estado de São Paulo já informou que, no segundo semestre, as escolas do Estado determinarão, conforme as suas possibilidades, o número de alunos que poderão participar presencialmente das aulas. Nada mais justo. A atitude anterior era esdrúxula, pois, fixando um percentual, ocorreram injustiças clamorosas. Numa classe onde houvesse apenas vinte alunos matriculados, somente seis podiam assistir presencialmente às aulas. Numa classe onde houvesse quarenta matriculados, doze alunos poderiam frequentar. Ocorre que o espaço físico podia ser o mesmo: de manhã, classe com quarenta alunos; à tarde, classe com vinte alunos. Há alguma lógica sanitária para num período só se permitirem seis alunos e em outro, doze? Claro que não.

Ainda bem que perceberam o erro. Terrível seria se essa postura maquiavélica permanecesse. Assim, aos poucos, iremos voltar à normalidade. Para que isso acontecesse, permitiram que uma verdadeira tempestade destruísse grande parte da educação escolar no Brasil. Num espaço onde o controle é muito mais fácil, deixaram fora da sala de aula milhões de alunos, com as sérias consequências tanto na área formativa como na área informativa. Tanto as escolas públicas como as particulares sofreram essas consequências. Principalmente, as escolas públicas, nas quais os recursos tecnológicos são muito menores. O déficit psicológico e de conhecimentos deve ser trabalhado com urgência, para que, num futuro próximo, possamos retornar ao estágio pré-pandemia, que já não era lá essas coisas.

Um dia desses, perguntaram-me o que deve ser feito nas escolas, após o retorno dos alunos. Não vai ser fácil. Além de todos os cuidados que devem ser tomados, para que a doença não se alastre novamente, é preciso um projeto pedagógico diferente para cada situação. Assim, o mais urgente é fazer uma avaliação diagnóstica séria, para se ter conhecimento da real situação em que se encontra cada aluno. As escolas descobrirão que, numa mesma classe, haverá situações completamente diferentes, que deverão ser trabalhadas psicologicamente. Com esses dados em mão, deverá ser feito um plano para cada grupo de alunos com problemas semelhantes. Não é hora de ficar analisando se esse ou aquele aluno deve ser promovido ou retido. Isso é secundário. Será hora de analisar o que deve ser feito pelos alunos, para que eles possam recuperar conhecimentos e readquirir o

hábito de estudos e o prazer em estudar e frequentar uma escola. Vou usar um termo que faz tempo que não emprego: trabalho hercúleo a ser feito. E como deverá ser hercúleo, é só para pessoas fortes, dinâmicas, que amam a educação e acreditam que só através dela é que conseguiremos cidadãos mais autênticos e capacitados para realizar a sua tarefa na sociedade.

BAHIGE FADEL

Paciência

Todo final de aula, quando me despeço dos alunos, além de desejar-lhes boas aulas, uma boa semana e muito cuidado, peço-lhes que tenham paciência, muita paciência, e que cuidem uns dos outros, para que possamos superar essa pandemia. Reitero que devem ter muita paciência, pois, depois de mais de um ano de limitações, preocupações e, principalmente, mortes, é muito difícil para o jovem manter a paciência. E se não a mantiver, fatalmente, não teremos como vencer esse mal que se alastra pelo mundo inteiro.

Além disso, quando tenho a oportunidade, peço aos alunos que não ouçam muito as notícias a respeito da doença.

Digo-lhes que todos devem estar atentos para as mais variadas situações que estão sendo criadas, aos protocolos que estão sendo orientados, às mudanças que estão ocorrendo, mas que devem filtrar muito bem as informações que nos são impostas pelos meios de comunicação. E digo-lhes isso pois tenho notado que raramente a mídia é imparcial. Parece que cada um tem um interesse particular, que nada tem a ver com a solução dos problemas da população.

É mais interessante para alguns alardear o número de mortos e espalhar o pânico do que informar o número de recuperados. Acontece que espalhar o pânico não resolve a situação. Isso só pode criar outros tipos de problemas, que se agravam com os males da pandemia. Já a notícia do crescente número de recuperados poderia criar nas pessoas esperanças de que, tomando os cuidados necessários, é possível livrar-se da doença.

E por que, com raras exceções, os meios de comunicação não fazem isso? É porque muitas empresas de comunicação têm interesses que não se referem a informar ou a esclarecer. É uma pena. Mas alguns meios de comunicação preferem tirar proveito desse problema em benefício próprio ou em prejuízo alheio. Há aqueles que parecem sentir prazer ao dizer que o aumento do número de casos da COVID-19 poderá prejudicar este ou aquele governante.

Li recentemente um comentário, que foi concluído com uma frase mais ou menos assim: se se mantiver essa situação, só faltará colocar as algemas em tal governante. Pode? Para esse jornalista, pode. Ele não está interessado na aceleração da chegada das vacinas, mas na prisão deste ou daquelemandatário.

É preciso separar o joio do trigo. Há muito joio nesse mundo atual. Há tanto joio, que está difícil encontrar o trigo. É preciso, então, muita paciência e cuidado. Podem estar querendo entregar-nos joio no lugar do trigo. O joio, embora seja muito parecido com o trigo, não serve para comer.

No meio da plantação do trigo, o joio é apenas uma erva daninha, que prejudica o crescimento normal do trigo. Que a gente esteja atento, para não ser enganado. Estão oferecendo muito joio como se fosse trigo. Isso, além de não resolver, prejudica.

BAHIGE FADEL

Anjos e demônios

Com certa impaciência, tenho notado que a política brasileira está sendo feita na base de anjos e demônios. Um lado – não importa se é oposição ou situação – se faz de anjo e acusa o lado oposto de demônio. São maniqueístas. Dividem o mundo entre o bem e o mal, sendo que no lado do bem só há virtudes e no lado do mal, só há defeitos. E essa guerra de maniqueísmo está se prolongando ao longo desses muitos meses de pandemia. Temo que continuará além da pandemia, sem trazer – infelizmente – nenhum bem para o Brasil. Ao final da guerra, não haverá vitoriosos. Mesmo aqueles que se acharem vitoriosos, não o serão, pois a vitória deveria ser de um Brasil melhor e mais justo, o que não ocorrerá.

A gente sabe que, na política, não há anjos. Ninguém chega lá através da completa pureza. E isso não é apenas no Brasil. O mundo inteiro, com pequenas variações, age do mesmo jeito. Demônios na política, acredito que haja alguns, mas não tantos quanto querem fazer parecer. E para ser franco, não é preciso ser anjo para ser um bom político. Vamos deixar que os anjos continuem com a sua permanente função nesse mundo de Deus: guardar a todos nós, para que corramos menos riscos. Na política, é preciso competência, honestidade e espírito público. Se um político unir essas três virtudes, basta. Não há a necessidade de que sejam anjos. Aliás, é bom que a gente desconfie bastante daqueles que se fazem anjos. Podem ser os mais demoníacos, os mais perigosos, os mais capazes de nos causar o mal.

Para usar uma terminologia antiga, não precisamos, na política e em nenhum outro lugar, de lobos com pele de cordeiros. Precisamos de pessoas que pensem menos em si próprias e mais nas pessoas que as levaram ao poder. Precisamos de políticos que pensem menos na próxima eleição e mais na real situação do país. Não deveria haver mais espaço para o político ‘rouba-mas-faz’. Não deveria haver mais espaço para o político ‘o-mundo-é-dos-espertos’. Não deveria haver mais espaço para o político ‘sou-mas-quem-não-é?’. Não deveria haver mais espaço para o político ‘eu-quero-é-me-locupletar’. Não deveria haver mais espaço para o político picaresco, que vive de se aproveitar dos outros, que tudo faz para tirar proveito próprio. Não precisa ser anjo, mas não pode ser demônio.

Infelizmente, nessa luta entre anjos e demônios, em que ambos os lados são postiços, só o povo será derrotado. E o pior de tudo é que os anjos e demônios podem sair ilesos, mas o povo, com certeza, sairá com máculas. E essa situação só mudará quando as pessoas perceberem que tanto os anjos quanto os demônios são falsos e não mais acreditarem neles. Precisamos de pessoas que pensem, não por nós, mas conosco, para podermos solucionar os grandes problemas da nação. E essas pessoas, estejam certos, não são nem anjos nem demônios.

BAHIGE FADEL

Triste conclusão

Acho que é definitivo. Não existe mais possibilidade de mudar. Eu bem que tinha uma esperançazinha, mas ela já se foi. Saiu correndo para longe e deixou minha ideia sozinha, isolada, sem ter para onde ir. Cheguei a uma triste conclusão: o longo tempo de pandemia, ao invés de ensinar as pessoas a se tornarem melhores, mais pacientes e solidárias, tornou-as piores. Bem piores.

Estranho fato é esse. Não conversei com nenhum especialista para saber se isso é normal. Normal ou não, é a triste realidade. O longo tempo de pandemia fez aflorar nas pessoas o que elas têm de pior, de mais desprezível, de mais abjeto. Bem, aí é um pleonasmo, mas ele vale como reforço do que eu penso a respeito do assunto.

O mundo está parecendo um monte de cães disputando um pequeno pedaço de osso. Sim, cães raivosos pelo pequeno pedaço de osso. Não é carne. É apenas osso. E os cães raivosos o disputam como se fosse o único alimento disponível. Lamentável. Contentam-se com o pedaço de osso. Não procuram alimento melhor. Não sabem que existe alimento muito melhor do que o pedaço de osso que disputam.

São pessoas menores. São cegas ou quase cegas. Se pudessem ver mais longe, perceberiam outras possibilidades além do osso. Perceberiam que todas as histórias de ódio de que tem notícia a humanidade resultaram em tragédia. O ódio é mais letal do que qualquer vírus. E não há vacina para ele. O ódio é mais violento do que qualquer vírus. Ele agride mais, ele machuca mais, ele destrói mais.

Um dia desses, assisti a uma daquelas reuniões de CPI do Congresso Nacional. Não vi ninguém interessado no país. Não vi ninguém interessado em encontrar uma solução para os nossos problemas. Não vi ninguém com uma alternativa plausível para acabar com a COVID em nosso país. Vi ódio. Pessoas demonstrando que o que importa é destruir o outro. Coisa triste. Fiquei angustiado. Qualquer que seja a conclusão a que chegar a tal CPI, o resultado será deplorável. Nada melhorará no país. Nenhum problema será solucionado. Só se saberá qual é o ódio mais eficaz, qual é o ódio que mais destrói, que mais mata.

É a epidemia do ódio. Ódio localizado em pessoas que deveriam fazer tudo com objetivos maiores. A economia brasileira está em frangalhos, mas não vejo os líderes do ódio oferecendo uma solução. A educação brasileira está em situação muito pior do que a péssima situação em que se encontrava antes da pandemia, mas não vejo ninguém procurando solução. Para alguns líderes, mais importante do que encontrar soluções é incrementar ódios, que geram novos problemas, que criarão mais ódios.

É uma pena! Nem uma pandemia é capaz de melhorar as pessoas. Ao contrário, a pandemia só está piorando pessoas. Espetáculo dantesco. Circo de horrores.  Roleta russa que faz mais vítimas do que o vírus e não cria nenhum herói.

BAHIGE FADEL